Agradecimentos
Mestre Liu Chih Ming , pelos conhecimentos valiosos transmitidos durante o curso.
Carlos de Oliveira de Souza, pela dedicação.
Toda família, pelo apoio.
Marina Brito, pela redescoberta.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO
2 O DIABETES SEGUNDO A MEDICINA OCIDENTAL
3 O DIABETES SEGUNDO A MEDICINA TRADICIONAL CHINESA
3.1 CONCEITO
3.2 ETIOLOGIA
3.3 CLASSIFICAÇÃO
3.4 TRATAMENTO
4 DISCUSSÃO
5 CONCLUSÃO
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. INTRODUÇÃO
O Diabetes faz parte das doenças crônico-degenerativas cuja incidência parece aumentar no mundo moderno. Mesmo quando detectado e tratado segundo o padrão corrente na medicina ocidental o Diabetes pode, a longo prazo, ter efeitos muito graves como vim a saber por experiência familiar. Em sequência a um descolamento da retina após uma operação de retirada da catarata, meu pai sofreu um enfarte grave do qual a muito custo sobreviveu . Para seu espanto e indignação, foi informado pelos médicos que ambos eventos poderiam estar relacionados ao Diabetes que imaginava controlado pela dieta, atividade física e "check-up" regulares que não tinham detectado nenhuma anormalidade nos últimos anos. Em seu entendimento, os riscos ligados ao Diabetes não existiam quando a glicemia encontrava-se controlada. Infelizmente descobrimos que os riscos são menores porém existentes e que a doença persiste mesmo quando os exames estão normais. Isto não surpreenderia um representante da MTC, para a qual a doença crônica é um processo iniciado muito antes da manifestação do sintoma e que, dependendo das medidas tomadas, continua mesmo se o sintoma aparentemente está controlado. Como veremos, para a MTC, o Diabetes não é definido pelas taxas ou curvas glicêmicas, conceito fisiológico desconhecido para ela, nem o tratamento pautado por este critério.
A medicina chinesa é reputada como tendo grande potencial preventivo. Isto não significa, como alguns interpretam equivocadamente, que ela não possa tratar a doença manifesta, mas que seus conceitos e métodos diagnósticos podem idealmente detectar desequilíbrio e portanto potencial patológico muito antes da manifestação de uma doença ou confirmar sua persistência apesar da ausência de sintomas. Medidas terapêuticas podem então ser propostas antes do desenvolvimento ou recorrência da doença. Nosso propósito nesta monografia é expor a visão da medicina tradicional chinesa sobre o Diabetes e discutir algumas de suas implicações.
2. O DIABETES SEGUNDO A MEDICINA OCIDENTAL
O Diabetes é dividido clássicamente em Diabetes Insipidus e Diabetes Mellitus .
O Diabetes Insipidus é uma desordem do sistema neurohipofisiário que falha em produzir suficiente vasopressina, um hormônio antidiurético. Esta deficiência resulta em polidipsia e poliúria, os sintomas típicos desta forma de diabetes. A produção e liberação da vasopressina é feita pelo hipotálamo, a hipófise sendo utilizada para armazená-la. A doença portanto envolve problemas no circuito hipotálamo - hipófise, como lesões nos núcleos hipotalâmicos ou na haste pituitária. As lesões podem ser primárias, de origem genética ou idiopática, ou secundárias, resultantes de trauma, neoplasmas, lesões vasculares ou infecções. Um outra forma de Insipidus deve-se à falta de reação dos rins à vasopressina. O tratamento é feito com uma droga análoga à vasopressina, drogas que reduzem a poliúria ou drogas que provocam a liberação de vasopressina nos pacientes que ainda tem um capacidade residual de produção.
O Diabetes Mellitus (DM) é "uma síndrome caracterizada por hiperglicemia resultante de deficiência absoluta ou relativa na secreção de insulina e/ou na ação da insulina." ( The Merck Manual, tradução minha)
O Diabetes Mellitus tipo I (Diabete Insulina-Dependente ou Diabete Juvenil) em geral manifesta-se já na infância ou adolescência, sendo o tipo predominante antes dos 30 anos. É caracterizada por hiperglicemia e propensão a cetoacidose. O pâncreas produz pouca ou nenhuma insulina, sua estrutura tendo sido danificada provavelmente por um processo auto-imune. O tratamento para este tipo é feito com insulina, dieta composta de forma a evitar tanto a hiper quanto a hipoglicemia e atividade física.
O Diabetes Mellitus tipo II (Diabete Não-Insulina-Dependente) em geral ocorre depois dos 30 anos, caracterizando-se por hiperglicemia e resistência à insulina, a cetoacidose sendo rara. Ele em geral está associado a obesidade, principalmente na região abdominal/visceral , manifestando-se frequentemente após um período de aumento de peso. O Diabetes Mellitus tipo II está relacionado a deficiência de secreção da insulina e à incapacidade da insulina em promover a captação de glicose pelo músculo esquelético e em restringir a formação de glicose pelo fígado (resistência à insulina). A resistência à insulina, se for acompanhada de aumento de secreção de insulina, não provoca o diabetes. O tipo II é tratado com dieta, atividade física e drogas hipoglicêmicas, eventualmente combinadas à insulina.
No Diabetes Mellitus a hiperglicemia provoca glicosúria e desidratação que por sua vez resultam em perda de peso e polidipsia. A hiperglicemia também pode causar visão turva, fadiga, náusea e propensão à infecções. A longo prazo podem ocorrer doenças vasculares como a ateroesclerose, retinopatia, nefropatia, polineuropatia, neuropatia autonômica, úlceras no pé e problemas articulares.
3. O DIABETES SEGUNDO A MEDICINA TRADICIONAL CHINESA
3.1 Conceito
O Diabetes Mellittus é conhecido na MTC como "Xiao Ke", isto é, uma doença caracterizada pela polidipsia, polifagia e poliúria (Jiazhen e Zhufan,1997). Segundo a MTC, o desejo de beber grandes quantidades de água fria indica a presença de Calor no organismo enquanto que a sensação permanente de fome é sinal de Calor no Estômago (Maciocia, 1989). A urina frequente e abundante indica deficiência do Rim (Maciocia, 1989).
3.2 Etiologia
A MTC reconhece três tipos de origem para o Diabetes Mellittus:
a) Danos no Baço e Estômago causados por alimentação inadequada:
A alimentação inadequada é um dos fatores que podem provocar doença, seja pelo excesso ou pela insuficiência. No caso do DM a ingestão excessiva de alimentos de natureza quente e/ou doce provocam o surgimento de Calor no Estômago e lesam o Baço. Os alimentos de natureza quente que, em excesso, podem gerar Calor no Estômago são as frituras, o álcool, as carnes feitas diretamente no fogo (churrasco) e as pimentas. A agressão ao Baço e Estômago (elemento Terra) ocorre diretamente e também através da dominação excessiva do elemento Madeira / Fígado sobre Terra, já que os alimentos quentes aumentam o Yang do Fígado. Outra forma de agressão ao Baço ocorre através do excesso de consumo do sabor doce, principalmente na forma de açúcar branco, pois este gera Umidade, fator cujo acúmulo a longo prazo pode converter-se em Fleuma e Calor. O açúcar branco também esgota o Yang do Rim e por consequência o Qi do Rim. O quadro de Fogo no Estômago caracteriza-se, entre outros sintomas, pela sede com desejo de líquidos frios, fome constante, sensação de queimação no epigástrio, sangramento gengival e mau hálito. A lesão das funções de transformação do alimento e transporte de energia, próprias do Estômago e Baço, pode provocar tanto obesidade ou emagrecimento. Juntamente com a dieta é preciso considerar também a possíbilidade do Estômago e/ou Baço serem constitucionalmente deficientes e portanto mais suscetíveis a desenvolverem patologias, inclusive o diabetes. O quadro psíquico também tem influência sobre o Baço e Estômago, já que a MTC considera que o excesso de trabalho intelectual ou preocupação lesam o elemento Terra.
b) Danos no Fígado devido a alterações emocionais:
O desequilíbrio emocional é um fator etiológico reconhecido pela MTC. Mencionamos acima que o Fígado, através de sua dominação sobre a Terra, tem participação na fisiopatologia do Diabetes. A presença de Calor no Fígado além de lesar Estômago e Baço também consome os Fluidos Corpóreos (Jin Ye), predispondo o organismo à Secura e ao Calor, quadros onde há polidipsia. O Calor no Fígado pode decorrer dos fatores dietéticos já analisados, ou emocionais. Emoções como o ressentimento, a fúria reprimida, a irritação, a frustração e a depressão estagnam o Qi do Fígado e podem, após um certo tempo, suscitar o surgimento do Calor no Fígado: "A Estagnação do Qi, por um longo período pode conduzir ao Fogo, uma vez que a implosão do Qi, causada pela repressão emocional, gera o Calor" (Maciocia, 1989). A expressão irrestrita da fúria, por outro lado, pode também provocar a manifestação do Fogo no Fígado, embora neste caso, o perigo maior não é a agressão ao Estômago, mas a ocorrência de um acidente vascular cerebral. O caminho do meio é sempre o melhor ...
c) Deficiência do Rim:
A deterioração do Qi do Rim pode desencadear também o Diabetes. A deficiência do Qi do Rim afeta a Bexiga, comprometendo sua funções de transformação, armazenamento e excreção, originando a poliúria. O processo que conduz ao quadro do DM parece iniciar-se através da Deficiência do Yin do Rim. Quando esta se agrava suscita o aparecimento do Calor-Vazio e, em consequência, secura e consumo dos líquidos orgânicos (Jin Ye). A sudorese noturna, boca seca a noite, sede e urina escassa e escura são algumas das manifestações típicas da Deficiência do Yin do Rim. A poliúria aparece em decorrência da polidipsia, gerada pela secura e diminuição dos líquidos orgânicos. A deficiência do Yin do Rim afeta também o Yin do Fígado e do Coração, predispondo ao surgimento de Fogo nestes sistemas. Ela pode ser constitucional quando há deficiência de Essência (Jing) ou adquirida pelo excesso de trabalho ou atividade sexual. A deficiência do Yin, assim como a de Yang, acaba afetando o elemento oposto, tornando-se Deficiência de Yin e Yang .
A Deficiência do Yang do Rim resulta em urina abundante e clara ou urina clara e escassa. A primeira situação parece corresponder ao Diabetes Insipidus, embora a Deficiência do Yang do rim, a princípio, não comporte desejo intenso de beber. A polidipsia talvez apareça em função da perda aumentada de líquidos, sequência inversa portanto à verificada na deficiência de Yin. De qualquer maneira, a poliúria e a polidpsia acabam engendrando uma a outra. A deficiência do Yang do Rim afeta o Yang do Baço, criando um terreno propício para o emagrecimento, fraqueza muscular e retenção de líquido (edema). A Deficiência do Yang do Rim pode surgir depois de longos períodos de doença, de atividade física ou sexual excessiva, envelhecimento ou por retenção prolongada de Umidade, causada por deficiência do Baço.
3.3 Classificação
Segundo Zhufan e Jiazhen (1997), o diabetes é classificado segundo o Aquecedor acometido.
O primeiro tipo é o do Aquecedor superior atingido. Isto ocorre quando o Calor patogênico consome o Yin do Pulmão, produzindo sintomas como sede intensa, secura na boca e na língua, poliúria, ponta da língua e borda vermelhas com revestimento fino e amarelo e pulso cheio e rápido .
O segundo tipo é o do Aquecedor médio. O Fogo excessivo do Estômago consome o Yin do Estômago, produzindo os sintomas de polifagia, emagrecimento, constipação, língua vermelha com revestimento seco e amarelo e pulso forte e escorrregadio.
O terceiro tipo é o do Aquecedor inferior e divide-se em dois subtipos. O primeiro corresponde a evolução prolongada de uma deficiência de Yin, na qual os sintomas são poliúria, urina turva, secura na boca, língua vermelha com revestimento escasso e pulso fraco e rápido. O segundo corresponde à evolução de uma deficiência de Yin e Yang do Rim e os sintomas são poliúria grave, urina turva, lassitude, sudorese espontânea, encurtamento da respiração, impotência, compleição escura, língua pálida com revestimento branco e pulso fraco e escondido.
3.4 Tratamento do Diabetes
Zhufan e Jiazhen (1997) organizam o tratamento segundo as classificações do Aquecedor.
No diabetes com acometimento do Aquecedor superior deve-se "expulsar o Calor, purgar o Fogo, aumentar a produção do Jin Ye e aliviar a sede" (idem). Seguindo estas recomendações, escolheríamos os pontos P1, P5 , P10 e B13 para eliminar o Calor do Pulmão e IG 11 e TA5 para diminuir o Calor geral, todos em sedação. Para promover a produção de líquidos orgânicos, BP6, VC4 e VC12, R6 combinado a P7. Após a eliminação do Calor do Pulmão, desejando-se tonificar o Yin do Pulmão, tonificar B43 e P9. Pontos auriculares: pulmão, calor, sede, endócrino, baço, pâncreas, rim .
No acometimento do Aquecedor médio, deve-se "remover o calor do Estômago e nutrir o Yin " (idem). E21, E44, E45 removem o calor do Estômago (sedação). IG4 e IG11 removem o Calor do meridiano Yang Ming, ao qual pertence o Estômago. VC 12 , VC13 (estimulação moderada) e PC6 (sedação) regularizam o Qi do Estômago, BP6, R3 e R6 promovem a produção de fluidos e do Yin. Os pontos E21 e o ponto entre B17 e B18, a 1,5 polegada da 8ª vértebra toráccica, agem sobre o pâncreas e tratam o diabetes segundo nossa linhagem "Agulha Dourada". Não havendo mais Calor no Estômago, estes pontos podem ser tonificados, assim como B20 e B21, pontos Shu nas costas do Baço e Estômago. Sedar F2 e/ou F3 se houver Calor no Fígado. Pontos auriculares: estômago, baço, pâncreas ou pancreatite se houver sintoma, rim, sede, nodo (se houver calor no Fígado) endócrino, calor, fome (se houver polifagia), shenmen.
No acometimento do Aquecedor inferior, nos casos de deficiência do Yin do Rim deve-se tonificá-lo através dos pontos R3, R6, R9, R10, VC1, VC4 e BP6. Se o Yin e Yang do Rim estiverem deficientes, acrescentar R7, B23, VC6 e VG4. Pontos auriculares: rim, endócrino, adrenal, baço, pâncreas.
Em relação à medicação chinesa, conforme o caso serão recomendáveis os compostos que drenam o Calor e tonificam o Yin, os compostos que drenam a Umidade e fortalecem o Baço/Estômago e os que fortalecem a energia do Rim.
Os alimentos recomendados para o Diabetes na visão da MTC seguem a mesma lógica. Sônia Hirsch (1990) indica o feijão-de-corda para fortalecer os rins e o baço, o farelo de trigo para refrescar e reduzir a glicemia e o leite de ovelha ou vaca (natural, não pasteurizado) para produzir os líquidos orgânicos e neutralizar o Calor. A batata Yakon , recomendada pelos japoneses para o Diabetes, provavelmente tem efeito refrescante e hipoglicêmico. Os grãos integrais (arroz, trigo, milho, cevada, painço), raízes ou tubérculos (batata-doce, cará, inhame, cenoura) e a abóbora redonda são importantes para fortalecer o elemento Terra.
Os treinamentos chineses indicados para tratar o diabetes são a auto-massagem do ponto E21 ensinada pelo Mestre Liu Chih Ming, As Nove Formas de Restaurar a Vitalidade ensinadas pelo Mestre Liu Pai Lin e os treinamentos que fortalecem os pés, pernas e cintura e consequentemente o baço, estômago e rins como o Tai Chi Chuan e a Série dos Órgãos Internos. A Postura da Árvore e o Sentar na Calma são importantes para restaurar o Yin. As Respirações da Tartaruga e a dos Seis Sons podem drenar o Calor.
4. DISCUSSÃO
O Diabetes Mellito na visão ocidental está relacionado à incapacidade absoluta ou relativa do pâncreas em produzir insulina, o que resulta em hiperglicemia. Isto é verdadeiro também para o fenômeno da resistência à insulina já que esta só leva ao diabetes quando o pâncreas não consegue aumentar sua produção de insulina. Segundo Maciocia (1996), o pâncreas não é mencionado nos livros da MTC, sendo considerado dependente do Baço, motivo pelo qual no Ocidente o meridiano do Baço é conhecido por Baço-Pâncreas. A lesão energética do Baço e o Estômago através da alimentação inadequada, como vimos, é uma causa possível de Diabetes para a MTC, conceito que concorda com a visão ocidental. Em relação à participação do Fígado no processo da doença, a medicina ocidental reconhece que diversas doenças endócrinas que podem desencadear o diabetes estão associadas a um problema hepático. Ela não vê relação entre o fígado e o comportamento emocional embora, através da Psicologia, tenha procurado detectar associações entre perfis psicológicos e o diabetes e entre o estresse e a ocorrência de doenças auto-imunes. Quanto à participação dos rins, a medicina ocidental entende que a nefropatia é uma das possíveis complicações a que o diabético está sujeito mas não concordaria com a visão de que a doença possa originar-se a partir deles e muito menos com a relação que a MTC estabelece entre a deficiência do Rim e a atividade sexual , na qual só reconhece efeitos positivos. Estas diferenças de conceito são muito importantes, pois implicam na recomendação de condutas ao paciente.
Em relação ao Diabetes Insipidus, em que estruturas como o hipotálamo e a glândula pituitária não estão funcionando bem, podemos nos perguntar o que, na visão da MTC, pode afetá-las. Segundo Maciocia (1996), o funcionamento do cérebro na MTC está relacionado à energia do Rim, cuja Essência (Jing) é a fonte para a produção da Medula, substância que na MTC é entendida como a matriz comum dos ossos, medula óssea, medula espinhal e cérebro. Além do fator constitucional, os comportamentos que afetam a energia do Rim e a Essência serão relevantes para a MTC para o desenvolvimento deste tipo de diabetes. A diferença entre as duas visões portanto remetem-se às próprias teorias de base que, no caso da MTC, postulam a existência de inter-relações entre o sistema energético e o corpo anatômico.
Na visão da MTC, o que há de comum nos três processos de desenvolvimento do DM é o surgimento de Calor e a deficiência de Yin. Sob esta perspectiva não é difícil entender como indivíduos pertencentes a culturas com baixa incidência de diabetes desenvolvem a doença ao adotar o modo ocidental de vida. O estresse intrínseco ao mundo do trabalho, o consumo de alimentos e drogas de natureza quente (chocolate, churrasco, salgadinhos fritos, álcool, tabaco, hormônios, vacinas e antibióticos), o estímulo constante da sexualidade pela propaganda e a diminuição ou ausência de tempos de recuperação (sono, descanso e lazer) são fatores que esgotam o Yin e a Essência e criam condições para o surgimento do Calor. Também os ambientes urbanos influenciados por um grande número de radiações quentes e a redução da presença vegetal e hídrica podem estar envolvidos, já que a MTC reconhece a ação patogênica dos fatores climáticos. O propalado aquecimento do planeta, por ação humana ou não, sinaliza que a Terra toda pode estar sofrendo de Calor e Deficiência de Yin.
Se tivéssemos que apontar o fator de maior peso, escolheríamos a alimentação, particularmente o açúcar branco e a farinha branca, pois só o fator alimentar parece estar alterado em populações com casos de diabetes que permanecem em seu ambiente original e não alteram muito seus hábitos de trabalho e relações humanas, como os povos indígenas. O padrão original de alimentação destes povos, pelo menos no Brasil, incluía alimentos de natureza quente como a carne de caça assada, gorduras animal e vegetal (côco), o álcool de mandioca ou milho consumido em festas e também alimentos doces, como as frutas e o mel, mas não o açúcar branco e os derivados de farinha branca. O problema da farinha branca é que os açúcares simples aumentam rapidamente a glicemia, exigindo resposta insulínica imediata, o que a longo prazo pode exaurir o pâncreas. Considerando o alto consumo de produtos feitos com farinha branca (pão, pizza, macarrão, esfiha, bolos, bolachas e tortas) no mundo todo e a presença ou combinação destes com açúcar branco e gorduras artificiais, o prognóstico não é muito favorável. Nosso argumento contra a farinha branca, porém, esbarra no consumo de longa data de macarrão e do pão feito no vapor pelo povo chinês, no qual não temos notícia de índices particularmentes altos de diabetes. Talvez a diferença esteja na ingestão de vegetais associada a estes produtos na China ou ao processo de fermentação do pão ocidental.
Além da alimentação, a vacinação contra múltiplas doenças e o contrôle de infecções pelos antibióticos talvez sejam também fatores importantes para o desenvolvimento do diabetes. Os vírus administrados nas vacinas e os antibióticos, pela sua natureza ou pelas reações que provocam, aumentam a temperatura corporal. Os hormônios também são considerados pela MTC como substâncias de natureza quente, de forma que, do ponto de vista da MTC, uma grande parte da farmácia ocidental contribui para a introdução de Calor no organismo.
5. CONCLUSÃO
Há pontos de contato entre as duas visões e também disparidade, devido à diferença de pressupostos. As tendências da pesquisa ocidental para o tratamento do Diabetes são as técnicas genéticas de identificação e correção dos genes responsáveis e a busca de regeneração do tecido pancreático através do transplante de tecido formado por células tronco. Recentemente foi publicado que os pacientes diabéticos poderão inalar insulina através de "spray ".
A MTC é obrigada pela sua própria filosofia a investigar o processo de cada paciente, sem esperar soluções universais. Sua teoria leva-a a considerar aspectos como o comportamento emocional e sexual, pouco relevantes para a medicina ocidental no caso do diabetes. A utilização de insulina, segundo Mestre Liu Chih Ming, a longo prazo é prejudicial ao doente, pois inibe um possível restabelecimento do funcionamento do pâncreas através de métodos energéticos. Em relação ao aspecto constitucional, a MTC acredita que é possível prevenir a manifestação da doença se medidas terapêuticas forem adotadas precocemente. Uma criança com deficiência de Essência, fator que pode levar ao Diabetes, pode tomar os compostos para este problema ou ser tratada com Tuiná ou acupuntura.
Sendo otimistas, diríamos que uma nova perspectiva pode nascer do diálogo das duas visões. A MTC pode beneficiar-se do conhecimento fisiológico adquirido pela medicina ocidental sobre o pâncreas. A medicina ocidental poderia testar experimentalmente as afirmações da MTC sobre os pontos de acupuntura que influenciam o funcionamento do pâncreas ou comparar pacientes tratados pelos dois sistemas. Para que isto ocorra entretanto, serão necessários médicos e pesquisadores que conheçam suficientemente as duas visões para entender suas conexões e diferenças.
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HIRSCH, S. Manual do Herói ou A Filosofia Chinesa na Cozinha. Rio de Janeiro, edição da autora, 1990.
MACIOCIA, G. Os Fundamentos da Medicina Chinesa. São Paulo, Roca, 1996.
THE MERCK MANUAL. 17ª edição, 1999.
ZHUFAN, X. ; JIAZHEN, L. Medicina Interna Tradicional Chinesa. São Paulo, Roca, 1997.
[René Victor Lenard. O Diabetes segundo a Medicina Tradicional Chinesa. Trabalho de conclusão do curso de Acupuntura II do Centro de Estudos de Medicina Tradicional Chinesa (CEMETRAC). São Paulo, 2002. Professor: Mestre Liu Chih Ming. Coordenador: Carlos Oliveira de Souza.]